Ao destacar na ata de sua reunião do último dia 20 que o aumento da incerteza sobre a inflação tanto no cenário externo como no doméstico, justificou a mudança em sua sinalização para os novos cortes da Selic, o Copom parece pavimentar o caminho para reduzir o ritmo da flexibilização monetária sem maiores ruídos, dizem os economistas.
Mesmo os especialistas que mantêm a visão de mais dois cortes de 0,50 p.p. na taxa, admitem que a decisão de política monetária de junho está em aberto.
Para o Itaú, o que a comunicação divulgada nesta terça-feira deixou claro é que a dependência de dados está de volta. Em relatório, o banco destaca que a Ata do Copom trouxe uma discussão mais detalhada sobre porque o “forward guidance”, a sinalização das reuniões à frente foi encurtado na reunião da semana passada.
“O Comitê enfatizou uma análise custo/benefício dessa decisão, em que a vantagem da menor volatilidade foi recentemente superada pelo custo da inflexibilidade num ambiente mais incerto, tanto no que diz respeito às perspectivas de atividade como de inflação”, diz o relatório.
O Itaú ponderou que os diretores do BC reforçaram que a alteração nas orientações futuras não deve ser confundida com uma indicação de uma mudança na dimensão do ciclo de cortes. “Mantemos nossa visão de uma taxa terminal de 9,25% ao ano, embora também de forma dependente de dados”, informou.
Para o Bradesco, O BC ressaltou que a alteração buscou aumentar a flexibilidade da condução futura da política monetária, uma vez que os riscos em torno do cenário base se elevaram.
“Com base no tom da ata, que reforçou a cautela diante de um ambiente de incertezas, mas sem alterar a trajetória esperada de política monetária, mantemos nossa expectativa de que a taxa Selic atingirá 9,25% até o final do ano”, diz o banco.
Para Marco Antonio Caruso, economista chefe do PicPay, em que pese a assimetria negativa, potencialmente de mais inflação, que a alta incerteza impõe parece que o cenário base para a reunião de junho não está fechado para o Copom, mas a chance de um corte de 25 pontos-base, hoje, é maior. Ou seja, seguindo a sinalização que o próprio BC deu na semana passada, o corte de 50 p.p. só está garantido para a reunião de maio.
“Vale notar que o Comitê demonstrou maior preocupação com possíveis efeitos dos salários reais e da aceleração do crescimento sobre a dinâmica da inflação”, comentou.
Gustavo Sung, economista chefe da Suno Research, por sua vez, disse ter visto no texto uma preocupação da autoridade monetária com a evolução dos preços de serviços, diante de um mercado de trabalho apertado, com reajustes salariais acima da meta inflação.
“Nossa perspectiva é de cortes de 0,50 p.p. nas próximas reuniões, pelo menos para maio e junho”, afirmou, ponderando que os próximos dados serão importantes para calibrar melhor o cenário à frente.
Débora Nogueira, economista chefe da Tenax Capital, também disse entender, que após o esperado corte de 50 bps em maio, a decisão em junho está em aberto. “A ata indica que se não houver redução da incerteza, o ritmo será reduzido para 25 bps por reunião”, estimou.
A economista lembrou ainda que o Copom ocorrer no mesmo dia que o Fomc e esse será um fator a ser considerado. “Poderemos ter uma incerteza a menos se o Fed entregar o corte na reunião de junho. Nosso cenário base permanece de taxa Selic terminal de 9,5% e corte de 50 bps em junho”, afirmou.
Mercado de trabalho no foco
Para Luis Otávio Leal, economista chefe da G5 Partners, no entanto, essa decisão de reduzir o ritmo de cortes vai depender das outras questões que são as incertezas que estavam no comunicado e que forma esmiuçadas ao longo da ata.
No caso da incerteza interna, ele destacou a ênfase dada ao mercado de trabalho, que está muito mais forte do que o esperado. Ele lembrou que o parágrafo 11 da Ata citou que os ganhos reais de salários não estão relacionados com ganho de produtividade. “Tem que acompanhar isso para ver se efetivamente vai impactar de alguma forma, vai diminuir o ritmo de convergência da inflação de serviços.”
João Savignon, chefe de pesquisa macroeconômica da Kínitro, foi outro economista citar que o conjunto de dados analisados será particularmente importante para definir o ritmo e a taxa terminal de juros.
Ele lembrou que o Copom mostrou certa dissidência ao destacar que alguns membros sinalizaram que a manutenção da incerteza ensejava um ritmo mais lento de cortes de juros, para qualquer taxa terminal que se deseje atingir. “Ou seja, o ponto final para o juro pode se manter inalterado, mas o Copom demorar mais para chegar lá”, explicou.
A Kínitro segue com sua visão de que o Copom tem condições de prosseguir com cortes de juros ao ritmo de 50 bps na reunião de maio e junho, desacelerando o ritmo apenas no segundo semestre do ano.
Para Matheus Pizzani, economista da CM Capital, é inegável que desequilíbrios entre os preços relativos de bens industriais e serviços podem ocorrer, o que não significa que o “guidance” da política monetária deve ser alterado, “uma vez que condições financeiras mais restritivas por tempo prolongado podem surtir pouco ou nenhum efeito sobre um problema desta natureza, que nasce no campo da oferta e não da demanda”.